sexta-feira, 21 de maio de 2010

Sócrates e o mundo gospel

“Estou apenas observando quanta coisa de que não preciso para ser feliz.” Essas, segundo Platão, são palavras de Sócrates ao passear pelo centro comercial de Atenas. Observar o que não é preciso para ser feliz é um exercício bastante inusitado. Não é comum alguém pensar sobre o que não é necessário ou o que não é útil, até porque pensar isso em uma sociedade de consumo soa como uma certa esquisitice.

Há uma certa loja muito conhecida no país que tem a seguinte frase de impacto: “ Vem ser feliz.” O ser feliz significa comprar algo naquela loja. Não se pode negar o poder do marketing, mas não se pode reduzir a vida e a felicidade a esse consumismo. É o mesmo que acreditar que alguém com um casamento arrebentado pode ser feliz comprando um celular novo. Talvez faça sentido para alguns, afinal, celular não tem sentimentos, portanto, não é capaz de de se estressar, de ficar emburrado, de ter TPM, mas também não é capaz de dar carinho, de encorajar, de abraçar. Celular é apenas um aparelho de comunicação, um produto de tecnologia. Tudo o que é tecnológico tem significado muito, pois o tecnológico é também simbólico, simboliza conquista, poder.

Não é muito difícil alguém pensar da seguinte forma: “Como houve vida antes da internet?” “Como pensar o mundo sem o msn ou o orkut?” O consumo e essa “tecnificação” da vida está levando as pessoas a um mundo tão virtual que nos faz voltar a Platão, com o mundo das ideias, da representatividade. A impressão que dá é que as pessoas, os sentimentos, o humano, nada mais são que representatividade e que o que interessa é o mundo virtual, o mundo do consumo.

Isso não é diferente no mundo evangélico e religioso. Ao pensar na oração, por exemplo, não significa mais, no imaginário das pessoas, uma forma de falar com Deus e de se relacionar com o Pai, mas uma maneira de se alcançar uma benção, uma espécie de cartão de crédito espiritual. Como não falar do conteúdo bíblico-teológico, que tem sido reduzido a meros chavões de auto-ajuda. A arte e a música no chamado mundo “gospel” tem sido muito mais um apelo de mercado, com um forte reforço de superficialidade, do que a preocupação com a vida e com a fé.

Talvez a provocação de Sócrates poderia ser feita nesse mundo “gospel”: “Estou apenas observando quanta coisa de que não preciso para ser feliz.” O que não preciso ouvir, o que não preciso cantar, o que não preciso participar, o que não preciso concordar, o que não preciso consumir.

Claudinei Fernandes

8 comentários:

  1. Muito boa a reflexão pastor, acho que cada um tem seus exegeros nesta área, e com certeza devemos buscar não viver de acordo com os padrões deste mundo de consumismo, mas sim buscar uma mente livre e preenchida pelo Espirito Santo de Deus.

    ResponderExcluir
  2. Olha Pastor Claudinei, é preciso refletir e ter uma vida sustentada pelo Espirito Santo pois muitas vezes somos seduzidos por essa avalanche de consumo e nem percebemos, Parabéns pelo artigo excelente.

    ResponderExcluir
  3. Em seu livro "O Mal estar da civilização" Freud, relata a insatisfação da sociedade, que insatisfação seria essa, para com a sociedade ou consigo mesmo? Pensar sobre o que eu não preciso para ser feliz parece-me muito util pois a felicidade não vem pelo ambiente externo, este é apenas o resultado final da motivação humana, a questão da felicidade para Freud está enraizada na base dos meus desejos (ID) com a possibilidade de realiza-los sem julgamentos e preconceitos do proprio individuo (superego)já para Jung é necessário encontrarmos com o Grande Homem interior, e nos desenvolver o maximo, utilizando e transformando toda a potencialidade para o concreto, nos tornando aquilo que somos, seres únicos. Parabens Pr. Claudinei pelo excelente artigo

    Thiago Morilha

    ResponderExcluir
  4. Deus o abençoe pastor! Concordo com sua reflexão e agradeço a Deus por ela.
    Parabéns por encontrar tempo em seu ministério e nos alentar através deste canal tão útil como esse blog.

    ResponderExcluir
  5. obrigado pelos comentários. São precisosos e enriquecem a reflexão. Abraço

    ResponderExcluir
  6. Bacana a sua reflexão.

    O teólogo Hugo Assman inaugurou o termo "Igreja Eletrônica" nos anos 80. Naquela época, segundo ele, a inteção era arebanhar pessoas para as igrejas. Hoje essa lógica mudou completamente, transformou no verdadeiro mercado religioso onde o Evangelho é apenas mais um produto. A partir desse produto, os empresarios (pastores televisivos) estão construíndo verdadeiros imperios com a desculpa de que é para a "obra do Senhor". Será que seremos capazes de usar os meios de comunicação em prol da ética e cidadania? Do jeito que as coisas estão indo, acredito que não.

    Valeu pelo texto...

    ResponderExcluir
  7. Mais uma vez o seu texto relata uma realidade que tenho pensado ultimamente, como as pessoas estão distantes de Deus e umas das outras, q triste realidade chegamos, é dificil ser diferentye, é dificil fazer diferença mais dificil ainda é mudar oque está consumado... Parabens pelo texto inteligente e q nos leva a refletirmos melhor e tomarmos decisões sábias, oque se pode mudar??? a começar em mim????

    ResponderExcluir
  8. e isso ai pastor, sempre combatendo o consumismo alienado em que vivemos, belissima reflexao... sabe uma vez vi um folheto evengelistica de uma igreja com a seguinte frase " pare de sofrer", creio que as pessoas querem um Cristo que sacie a vontade de consumidor delas; mas aí é outra historia.

    ResponderExcluir